quinta-feira, 15 de maio de 2008

Até onde nossos olhos podem ver...

Já vi pais alegres por seus filhos de catorze ou quinze anos saberem manusear corretamente um carro de uma esquina a outra ou mãe orgulhosas por suas filhas terem lavado alguns pratos. Em suas palavras estão virando “rapazinhos” e “mocinhas” e dentre as circunstâncias nas quais foram criados não os reprimo por tamanha excitação.
Mas, agora, olhemos um pouco para o mundo que gira ao nosso redor. Quantos garotos de dez, onze anos ou, ás vezes, menos não carregam nas costas o sustento de uma família miserável na qual o pai é vagabundo e a mãe doente? Quantas meninas não são perfeitas donas de casa antes dos dez?
Checando por esse lado, o menino-e-seu-carro assim como a menina-e-seus-pratos não parecem feitos tão incríveis. Eu diria até insignificantes comparados ao que milhares de crianças enfrentam diariamente no Brasil.
Aos dez anos minha mãe saiu do interior do Rio Grande do Norte e seguiu seus tios para Maranguape, no Ceará, com a promessa do uso de um sabonete, ou pasta de dente e até atraída por ver uma televisão. Seu primeiro ato ao chegar a tal casa foi lavar (em cima de dois tijolos para alcançar a torneira) um monte, literalmente, de objetos domésticos que iam do chão até onde lhe foi permitido equilibrar. Mas isso não era nada para quem tinha como costume enfrentar a roça todos os dias.
Meu pai saiu de casa, também, jovem. Foi em busca do sonho de se formar e alcançar além dos “serrotes” de Espinheiro, no Ceará. Foi por vontade e conta própria para Madalena, Fortaleza e posteriormente Maranguape, utilizando-se do seu trabalho para sustentar-se. Provavelmente, quem o tivesse visto somente no início de sua vida não acreditaria que ele se tornasse o que é hoje.
Quantos não tiveram que passar por dificuldades maiores ou menores que essas pra alcançar seus objetivos? E quantos desses não venceram na vida e não são considerados um exemplo a ser seguido?
Isso sim é um motivo forte para se ter orgulho. Com certeza, bem maior do que o neném-do-berço-de-ouro ter aprendido a fazer o “pipi” no “troninho”.
Não reprimo pais que se alegrem com cada mínima conquista de seus filhos. É normal. Mas por que não ser mais um no mundo a olhar pelos que não têm a mesma sorte que muitos de nós temos? Por que não reconhecer a verdadeira conquista diária que passa despercebida (ou tolamente ignorada) aos olhos de quem mais deveria enxergá-la?
Por isso, pensemos duas vezes antes de chamar uma criança com trajes velhos ou rasgados de “moleque” ou um adulto pobre de vagabundo. Você não pode saber de quanta garra eles precisaram ou quantos desafios enfrentaram pela simples arte de sobreviver.

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